Se ninguém me pergunta, eu o sei; mas se me perguntam, e quero explicar, não sei mais nada.
(Santo Agostinho, em "As Confissões")
Mais um verão que chega. Menos um dia para o outono. Mais um minuto de aprendizados. Menos um dia de vida. Mais um ano que se passa em nossas vidas. Para alguns, um ano demais; para outros, com dias demais.
Toda vez que um ano nos escapa, é natural a retrospectiva mental dos eventos que o fizeram chegar ao seu fim tal como ele chegou. Há rios que fluem apenas na ânsia de perecer ao mar; há outros rios que, de janeiro a dezembro, observam atentos as margens que o levaram a correr. Essa reflexão, íntima da alma, chega a ser tão inexcedível como o próprio tempo.
De um telescópio ao revés, olhei para o meu 2014. Mas me foi necessário, também, um microscópio e um estetoscópio. Impossível seria conseguir visualizar, hoje, sua grandiosidade, não fosse o fato de eu me permitir relembrar dos tantos pequenos prazeres que nele existiram. Ouvi o meu ano e o que ele tinha a me dizer.
Esse ano foi um ano bom. Um ano-ponte, assim eu o caracterizo. Apenas pontes nos fazem passar de um lado conhecido a outro inimaginável, mantendo os nossos pés sobre o chão. Há muito que espero essa metamorfose de 2014. Tive que atravessar todo ele, tateando corrimões e oscilando aos seus degraus, para que eu veja 2015 se plenificar.
Aprendi a esperar, escolhi uma especialidade para a vida profissional, descobri novos abraços, revivi um amor antigo, escrevi mais do que eu gostaria, li menos do que eu queria, pedi desculpas e desculpei à mesma proporção, despersonifiquei a perfeição, vislumbrei uma sociedade em seu potencial macro, minimizei muitas janelas de problemas. Foi um ano em que pude senti-lo bastante construtivo, ao menos humanamente.
Viver de presentes é ao que nos convida Santo Agostinho: o presente do passado é a memória; o presente do presente é a intuição direta; o presente do futuro é a esperança. Para 2015, tenho esperanças na aspiração ao autoaperfeiçoamento e às virtudes. Acho que, assim, poderei seguir num ano de paz e em paz; interpessoal, intrapessoal.
Que, então, nos seja apresentado um Ano-Novo feliz, de travessias sabidamente irregressáveis, que nos permitam aportar de cais em cais, (ad)mirando outros rios cujos barcos sigam no mesmo navegar que o nosso.